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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
GRUPO DE TRABALHO AMAZÔNIA LEGAL
4a CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO
RECOMENDAÇÃO No 01/2024
REFERÊNCIA: NF no 1.13.000.000858/2024-46
RECOMENDANTE: Ministério Público Federal
RECOMENDADOS: Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Banco da
Amazônia, Banco de Lage Landen Brasil (DLL), Banco Sicredi, Bradesco, Itaú e
Santander
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelos Procuradores da República signatários,
no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, resolvem expedir a
presente RECOMENDAÇÃO, nos seguintes termos:
CONSIDERANDO que o Ministério Público é instituição permanente, essencial à
função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do
regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (artigo 127
da Constituição Federal);
CONSIDERANDO que o Ministério Público tem como uma de suas funções
institucionais a promoção do inquérito civil e da ação civil pública para a proteção do
patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e
coletivos (artigo 129, inciso III, da Constituição Federal e artigos 5o e 6o da Lei
Complementar no 75/93);
CONSIDERANDO que compete ao Ministério Público Federal expedir
recomendações, visando à melhoria dos serviços públicos e de relevância pública,
bem como ao respeito aos interesses, direitos e bens cuja defesa lhe cabe
promover, fixando prazo razoável para a adoção das providências cabíveis (artigo
6o, inciso XX, da LC no 75/93);
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CONSIDERANDO que a recomendação é instrumento de atuação extrajudicial do
Ministério Público, por meio do qual expõe, em ato formal, razões fáticas e jurídicas
sobre determinada questão, com o objetivo de persuadir o destinatário a praticar ou
deixar de praticar determinados atos em benefício da melhoria dos serviços públicos
e de relevância pública ou do respeito aos interesses, direitos e bens defendidos
pela instituição, atuando, assim, como instrumento de prevenção de
responsabilidades ou correção de condutas (artigo 1o da Resolução no 164/2017 do
CNMP);
CONSIDERANDO que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo
para as presentes e futuras gerações (artigo 225 da Constituição Federal);
CONSIDERANDO que um dos princípios da ordem econômica é a defesa do meio
ambiente (artigo 170, inciso VI, da Constituição Federal);
CONSIDERANDO que a Floresta Amazônica brasileira é patrimônio nacional, e sua
utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a
preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais
(artigo 225, §4o da Constituição Federal);
CONSIDERANDO que o Ministério Público Federal instaurou a notícia de fato no
1.13.000.000858/2024-46 a partir de representação do Greenpeace Brasil, versando
sobre possíveis infrações e irregularidades relacionadas a operações de crédito
rural;
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CONSIDERANDO que, analisando imóveis listados na base do Banco Central que
receberam crédito rural, entre 2018 e 2022, o Greenpeace identificou, no bioma
Amazônia, 10.074 propriedades inseridas parcial ou totalmente em unidades de
conservação, sendo que 41 delas estão localizadas em áreas de proteção integral;
24 propriedades sobrepostas, parcial ou totalmente, a 7 terras indígenas; 21.692
imóveis sobrepostos a florestas públicas não destinadas (FPNDs); 798 imóveis
financiados com embargo do Ibama; e a ocorrência de desmatamento recente em
29.502 propriedades (maiores que 1 hectare);
CONSIDERANDO que, nos autos da notícia de fato, foram solicitadas as seguintes
informações ao Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Banco da Amazônia,
Banco de Lage Landen Brasil (DLL), Banco Sicredi, Bradesco, Itaú e Santander:
i) Como avalia se a propriedade atende as condicionantes estabelecidas na Seção
9 do Capítulo 2 do Manual de Crédito Rural (Impedimentos Sociais, Ambientais e
Climáticos), antes da concessão do crédito, devendo indicar as bases de dados
consultadas e as ferramentas tecnológicas eventualmente utilizadas;
ii) Se realiza o monitoramento contínuo da propriedade financiada até o
vencimento da operação;
iii) Em caso positivo, se adota alguma medida caso verifique impedimento
superveniente, como suspensão da liberação de parcelas ou vencimento
antecipado do contrato, inclusive nos contratos celebrados anteriormente à
vigência da Resolução CMN no 5.081, de 29 de junho de 2023;
iv) Se incluiu, nos instrumentos de crédito das novas operações de investimento,
cláusula prevendo que, em caso de surgimento de impedimentos sociais,
ambientais e climáticos posteriormente à contratação da operação, o contrato será
considerado vencido antecipadamente pelo agente financeiro.
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CONSIDERANDO que, pelo teor das respostas, é possível afirmar que os bancos
possuem ferramentas para verificar a conformidade das operações de crédito com
as normas socioambientais, podendo evitar, assim, a aplicação de recursos em
empreendimentos localizados em áreas cujo uso seja vedado pela legislação ou
pela regulamentação aplicável ao crédito rural;
CONSIDERANDO que, apesar disso, alguns bancos informaram que não
pretendem cancelar operações irregulares realizadas antes da vigência da
Resolução CMN no 5.081, de 29 de junho de 2023, sob a alegação de que devem
ser observadas as regras do Manual de Crédito Rural vigentes à época, “em
respeito ao ato jurídico perfeito e ao preceito constitucional de não retroatividade da
lei no tempo (art. 5o, XXXVI da Constituição Federal de 1988)”;
CONSIDERANDO que essa alegação não procede, uma vez que a Constituição
Federal assegura o usufruto exclusivo dos povos indígenas sobre seus territórios, de
modo que são considerados nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os
atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras indígenas
por não indígenas (artigo 231, §§2o e 6o, da Constituição Federal);
CONSIDERANDO que, de igual modo, a Constituição Federal prevê a existência de
espaços territoriais especialmente protegidos (artigo 225, §1o, inciso III), a exemplo
das unidades de conservação (Lei no 9.985/2000) e das florestas públicas não
destinadas (Lei no 11.284/2016), cabendo ao poder público empregar os meios e
esforços necessários para evitar e reprimir invasões nas áreas sujeitas à concessão
florestal (artigo 2o, §3o da Lei no 11.284/2006);
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CONSIDERANDO que o Cadastro-Geral de Florestas Públicas da União é composto
por terras indígenas, unidades de conservação federais e florestas localizadas em
imóveis urbanos ou rurais matriculados ou em processo de arrecadação em nome
da União, autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia
mista1
(artigo 2o, §2o do Decreto no 6.063/2007);
CONSIDERANDO que, segundo um estudo do Instituto de Pesquisa Ambiental da
Amazônia - IPAM, terras indígenas e unidades de conservação são as terras
públicas menos desmatadas na Amazônia, ao passo que, entre 1997 e 2020, 87%
do desmatamento nas terras públicas da região aconteceu nas glebas públicas não
destinadas2
, sendo 16% em florestas públicas não destinadas (equivalente a cerca
de 3,4 milhões de hectares de desmatamento) e 71% em outras terras públicas não
destinadas (14,8 milhões de hectares de desmatamento)3
;
CONSIDERANDO, ainda segundo o estudo do IPAM, que aproximadamente 28%
das áreas de florestas públicas não destinadas possuem registro no Cadastro
Ambiental Rural, apesar de não serem passíveis de regularização para uso
particular, o que seria um indício de grilagem e prenúncio de uma explosão do
desmatamento ilegal nestas florestas não destinadas nos próximos anos;
1Destaca-se, aqui, a floresta pública do tipo B, que possui dominialidade pública, mas ainda não foi destinada à
utilização pela sociedade, por usuários de serviços ou bens públicos ou por beneficiários diretos de atividades
públicas, nos termos do artigo 6o, inciso II, da Resolução no 02, de 06 julho de 2007, do Serviço Florestal
Brasileiro.
2 As glebas não destinadas dividem-se em florestas públicas não destinadas (FPND), constantes no Cadastro
Nacional de Florestas Públicas gerido pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB), e em outras terras não destinadas
(OTND).
3 SALOMÃO, C.S.C., Stabile,M.C.C., Souza, L., Alencar, A., Castro, I., Guyot, C.,e Moutinho, P. Amazônia em
Chamas - desmatamento, fogo e pecuária em terras públicas: nota técnica no 8. Brasília, DF: Instituto de
Pesquisa Ambiental da Amazônia, 2021. Disponível em: https://ipam.org.br/bibliotecas/amazonia-em-chamas-8-
desmatamento-fogo-e-pecuaria-em-terras-publicas/. Acesso em 24.05.2024.
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