Boato distorce conteúdo de discussão sobre educação sexual no Ceará

Não é verdade que Secretaria Municipal de Educação de Fortaleza tenha distribuído material que sugere a “masturbação infantil” para acalmar crianças; boato foi espalhado por ex-candidata do PSL

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Por Alessandra Monnerat
Atualização:

Não é verdade que a Secretaria Municipal de Educação de Fortaleza tenha distribuído para profissionais de creches da capital do Ceará material que sugere a "masturbação infantil" para acalmar crianças. Diversas publicações virais em redes sociais retiram de contexto uma apresentação preparada por uma formadora de professores da rede pública sobre sexualidade infantil. 

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Os trechos apontados como "incentivo à pedofilia" são, na verdade, apenas citações de um estudo que oferece uma perspectiva histórica sobre a sexualidade na infância. A passagem mencionada descreve como era a vida na Europa nos séculos XV e XVI, quando "a criança não existia como um ser social, pois durante muito tempo foi considerada um adulto em miniatura". A pesquisa afirma ainda que eram comuns matrimônios aos 12 e 13 anos de idade naquela época.

Creche Escola Vovô Tonico, em Fortaleza, no Ceará. Foto: Marcos Moura/Prefeitura de Fortaleza

O estudo afirma que entender a história da infância no mundo ocidental é importante "para compreender os ditos sobre a sexualidade da criança na sociedade contemporânea". Essas citações estão na página 5 do artigo "Sexualidade e infância: contribuições da educação sexual em face da erotização da criança em veículos midiáticos", publicado em 2014 na revista acadêmica Contrapontos e assinado por pesquisadoras da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Araraquara. 

O texto se propõe a "mostrar as contribuições da educação sexual, em âmbito escolar, como forma de mitigar os efeitos da mídia, que acarreta por vezes a erotização precoce da criança".

O artigo foi utilizado pela educadora Elisabete Cabral em uma reunião com colegas da rede pública municipal em agosto, segundo ela informou ao site Aos Fatos. Segundo Elisabete, a discussão sobre educação sexual foi uma demanda dos próprios professores, que precisavam de subsídios para lidar com situações que ocorrem nas salas de aula. 

"Esse tema [da educação sexual] foi escolhido em uma pesquisa que fizemos com professores da rede, devido a casos de abuso infantil [contra alunos], a maioria das vezes praticada por pessoas da família", disse Elisabete a Aos Fatos. 

A pedagoga também negou a Aos Fatos que o material elaborado por ela faça parte de material oficial da prefeitura. O Estadão Verifica não conseguiu contato com Elisabete. 

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Material com discussão sobre sexualidade foi retirado de contexto. Foto: Reprodução/Facebook

Em nota divulgada à imprensa, a Secretaria Municipal de Educação de Fortaleza informou que o material que circulava nas redes sociais era falso. O órgão afirmou que se tratava de "montagem grosseira, utilizando indevidamente a identidade oficial da referida Secretaria Municipal".

A nota afirma ainda que "não há produção e distribuição de qualquer material pedagógico sobre sexualidade infantil para as unidades de educação infantil do Município e que o tema também não faz parte das diretrizes curriculares da educação infantil de Fortaleza".

O órgão afirmou também que havia pedido a abertura de inquérito policial para apurar "a autoria de crime com informações mentirosas vinculando o nome da secretaria".

O Sindicato União dos Trabalhadores em Educação de Fortaleza (Sindiute) também divulgou um nota em que afirma que a acusação de que a prefeitura estaria ensinando "professores a trabalhar a sexualização na primeira infância" é falsa. De acordo com a entidade, o material distribuído nas redes sociais é "montagem produzindo uma leitura equivocada dos fatos".

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A acusação original de que o material de formação de professores estimulava a "masturbação infantil" foi feita em um vídeo de Regina Villela, ex-candidata do PSL ao cargo de deputado federal no Ceará. Ela já havia espalhado o boato, desmentido pelo Estadão Verifica, de que a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) havia desviado R$ 500 milhões. 

Além de Aos Fatos, os sites E-Farsas e Boatos.org também desmentiram este conteúdo, selecionado para checagem por meio da parceria entre Estadão Verifica e Facebook. Para sugerir verificações, envie uma mensagem por WhatsApp ao número (11) 99263-7900.

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