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Díalogos do Vestir #12 - Sofia Tsirakis, Inaê Moreira e Morena Nascimento

Díalogos do Vestir #12 - Sofia Tsirakis, Inaê Moreira e Morena Nascimento

2023-08-21

Nossas convidadas do Diálogos do Vestir #12 são: Sofia Tsirakis, Inaê Moreira e Morena Nascimento, dançarinas e parceiras no projeto MAMA SY YIÁ, idealizado pela CIA Danças Polifônicas.

MAMA SY YIÁ significa descolonizar a maternidade e nossa relação com as crianças e pretende dar continuidade à pesquisa e criação da CIA Danças Polifônicas após um mergulho profundo no processo de duas gestações, partos e início da maternidade vivenciado pela diretora Sofia Tsirakis desde o começo de 2019. 

Arte e vida sempre estiveram presentes nos projetos. Se faz necessário refletir, discutir e se aprofundar em temáticas acerca de um corpo-mãe dançante e seus desdobramentos, e de como podemos pensar a presença das crianças junto, fazendo parte do cotidiano adulto.

Elas abrem os bastidores desse projeto para uma conversa sincera e para servir como cenário para nossas peças da linha Caaipora - Tudo que é vivo regenera. Suas lindas memórias afetivas do vestir se entrelaçam neste novo diálogo. 

As fotos são do parceiro Marcos Pacheco.

Sofia, explica um pouco sobre as Danças Polifônicas e seus projetos?

 

SOFIA: "Durante meus estudos fora do Brasil, começou a pulsar em meu corpo uma forma de dança que tem revelado uma potência especificamente brasileira no jeito de mover e na musicalidade do gesto. A companhia Danças Polifônicas nasceu como um colo, um campo de contenção para aprofundar essa pesquisa, que iria aos poucos gerar uma linguagem e modo de trabalho próprios. Danças Polifônicas atualmente tem em seu núcleo artístico também o músico e compositor André Balboni, meu parceiro de vida e a produtora Iolanda Sinatra. Funciona como plataforma para colaborações com outros artistas da dança e de outras áreas. “Polifônicas” vem da palavra grega antiga “polifonia” que significa muitas vozes. Em seus projetos, portanto, a companhia tem como foco trazer a dança em diálogos transdisciplinares, principalmente com a música, mas também com o teatro, a literatura, as artes visuais, a moda. Em nossos processos criativos, cada colaborador tem espaço para expressar sua voz própria."

Como é o processo criativo e de onde surgem as inspirações? Vocês criam sozinhas ou coletivamente?

 

SOFIA: "MAMA SY YIÁ é o primeiro projeto no qual nós três estamos colaborando juntas em uma criação artística. Está sendo um processo maravilhoso, um encontro de muita fluidez. Eu, Sofia, fui quem idealizou o projeto e convidei Inaê e Morena, a partir de sonhos e intuições muito fortes. Por isso, nosso encontro parece para mim algo que já vem de longe, apesar de ser a primeira colaboração. Estou na direção da criação, mas Inaê e Morena estão criando juntamente comigo e com André (direção musical), pois essa obra fala das experiências muito íntimas e próprias que cada uma tem com a maternidade. E, ao mesmo tempo, a obra tem sido guiada por uma conexão com a natureza e as mães orixás, em especial Oxum. Nos nossos encontros de criação, muitas danças surgem entre nós de uma forma especial, em um fluxo de criatividade e troca. Tenho muito a agradecer por essa qualidade de colaboração."

INAÊ: "O projeto se inspira nas memórias que as três bailarinas e mães, viveram desde a gravidez, parto, puerpério e até hoje na criação de seus filhos, enquanto seguem suas pesquisas artísticas e criativas. Uma importante inspiração para o projeto é a Orixá Oxum, que no candomblé é vinculada às águas doces, à fertilidade e principalmente à maternidade."

MORENA: "Sinto que posso ser livre e entregar muitas camadas de mim e ao mesmo tempo sou ancorada por um olhar sensível, delicado e muito profundo de meus companheiros."

Como começou a trajetória de vocês na dança e quais são suas referências?

 

INAÊ: "Hoje entendo que começou quando eu era muito pequena e chegava da festa de candomblé com minhas irmãs Safira e Daza. A cada vez que chegávamos desses rituais, amarrávamos vários panos pelo corpo e dançávamos em roda mimetizando tudo que havíamos aprendido, e as danças ocupavam, sem dúvida, imenso protagonismo, as danças dos Orixás. Naquele momento meus pais perceberam meu interesse por mover e criar, e, com 13 anos de idade, ingressei na Escola de Dança da FUNCEB, onde tive meu primeiro contato com aulas de Ballet Clássico, Dança Moderna e Danças Populares. Minhas principais referências são as mestras e mestres da cultura popular, das danças de matrizes africanas e dos blocos de carnaval, afoxé, jeje, nagô."

SOFIA: "Minha trajetória na dança começou aos 3 anos de idade, nas aulas de dança contemporânea para criança com Liz e Beth Bastos e foi uma relação de um grande amor, desde essa idade, eu consigo me lembrar bem. Como as relações amorosas, vivi como uma paixão arrebatadora em alguns momentos, que me fizeram exagerar. Na adolescência me joguei tanto na dança, que acabei por treinar balé clássico com ponta e quebrei meu tornozelo. Então vivi um distanciamento por uns três anos, nos quais me formei em filosofia e artes na universidade de Princeton, nos EUA. Depois de curada da cirurgia no tornozelo, o amor à dança retornou e embarquei nessa construção de uma formação profissional na área, depois de já graduada. Estudei e trabalhei ao lado de Beth Bastos, Zélia Monteiro, Lu Favoreto em SP, fiz a formação profissional do Merce Cunningham nos EUA e acabei fazendo cursos, residências e trabalhos de dança na Europa, buscando maior proximidade com uma linguagem de dança de uma das minhas grandes referências, que é Pina Bausch. Fora ela, no meu fazer na dança se costuram muitas outras referências: Klauss Vianna através dessas três grandes mestras (Beth, Zélia e Lu Favoreto), Contato Improvisação, Trisha Brown, Técnica Alexander, Ralph Lemon coreógrafo mais contemporâneo, enfim. Já há mais de 10 anos que essas referências vivem em mim de forma totalmente misturada e original, pois foi houve um momento no qual uma dança muito própria minha quis surgir, que tinha elementos que eu não pude encontrar fora, ou seja, não encontrei nenhum grupo ou coreógrafo que estivesse criando dança da maneira que eu sonhava em criar. Daí nasceu a Danças Polifônicas."

MORENA: "Minha trajetória com a dança começou observando minha mãe e meu pai, que eram artistas da dança e viviam disso. Davam aulas, coreografavam grupos e produziam espetáculos em Belo Horizonte. Vivenciei muito o ambiente das salas de ensaio e camarins até meus 6 anos. Após esse periodo, meu pai se envolveu intensamente com a vida acadêmica, na Unicamp, em Campinas, e nossa casa era visitada por muitos estudantes da dança, do teatro e da música, os quais meu pai orientava em seus projetos acadêmicos. Talvez por isso eu tenha absorvido um jeito oscilante entre prática e reflexão desde muito cedo. Frequentei aulas de jazz, dança moderna, dança clássica, maculelê e capoeira dos 11 aos 17 anos e após esse período ingressei na graduação em dança pela Unicamp, onde mergulhei profundamente numa experiência intensiva de descoberta da dança como um caminho que eu queria verdadeiramente seguir. Meus mestres e mestras ali foram inesquecíveis e eu sigo reverberando seus saberes. Holly Cavrell, Graziela Rodrigues, Inaicyra Falcão, Eusébio Lobo e Márcio Aurélio são algumas das referências dessa época pra mim até hoje. Integrei grupos de dança após me formar  como o Primeiro Ato Grupo de Dança e o Tanztheater Wuppertal Pina Bausch. Na Alemanha, minhas maiores referências foram Malou Airadou, Lutz Föster, Anne Marie Benati e Dominique Mercy. Estudei na Alemanha dança flamenca e essa arte segue sendo uma das minhas maiores paixões e inspirações para o enfrentamento cênico, pela sagacidade gestual e pela força que vem de uma luta ancestral profunda do povo cigano e isso conversa diretamente comigo. A minha relação com músicas de várias partes do mundo, como por exemplo a música húngara, a flamenca, a música pop e o jazz, constituem pra mim um campo fértil de interlocução para a criação de dispositivos coreográficos. Não vivo sem música pra coreografar. As músicas me situam no espaço e na imagem de cada uma das danças que crio. Assim como a música, as imagens (fotografia, cinema, roupa) também funcionam como norteadores de sentimentos de minhas criações e eu só posso aceitar que todas essas camadas artísticas me atravessem profundamente sem hierarquia."

Morena, para você qual a diferença de dançar e ensinar seus alunos e alunas? O que fez você querer dar aula?

MORENA: "Dar aulas me parece ser uma maneira de dividir toda a intensidade que senti e sinto ao dançar. Como se eu tivesse um desejo de conseguir cúmplices da dor e da plenitude que é se entregar para esse ofício. Ao dançar, me sinto só e não tenho como escapar. Mas, quando estou no lugar da troca artístico-pedagógica, dando aulas, confesso sobre os lugares que visitei no meu inconsciente e no chacoalhar das minhas células, toda a cura que a dança pode acessar em nós. Consigo convidar a todos a experienciarem isso comigo. Procuro guiar as pessoas que fazem minha aula a um lugar que faça sentido para elas. No fundo acho que o momento de uma aula de dança é um grande momento de salvação."

Inaê, conta um pouco pra gente sobre a sua dança intuitiva?

INAÊ: "A Dança Intuitiva, que nasce em 2018 na cidade de Salvador/Bahia, tem o propósito de reunir mulheres e despertar suas potências criativas através da Dança. Uma plataforma sensível, direcionada para o autocuidado e a manutenção da nossa criatividade. A prática interliga a dança das Yabás (nome dado aos orixás femininos) aos elementos da natureza e os ciclos lunares, e acontece presencialmente, mas também virtualmente. Compartilhando saberes ancestrais africanos sobre corpo, saúde holística e espiritualidade, já viajamos por São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Fortaleza, e outros países como México e EUA. Tem sido um terreno fértil para semear sonhos dançantes e colher experiências transformadoras. Mais informações pelo site: www.inaemoreira.com

Qual é a relação de vocês com o vestir?

 

INAÊ: "Ela se conecta muitíssimo com a maneira que manifesto a minha arte, atravessada pela criatividade e estética afrobrasileira, desde uma infância vivida entre os terreiros de candomblé, ao contato com as tantas outras manifestações populares na cidade de Salvador/Bahia onde nasci e me criei. Dentro dessa cultura sempre percebi a vestimenta como mais um elemento vinculado à espiritualidade, por exemplo, para cada dia da semana usamos preferencialmente a cor associada ao Orixá daquele dia, como na sexta-feira de Oxalá onde todes usamos branco. As cores, saias rodadas, turbantes e tecidos africanos de capulana que minha mãe usava marcaram meu imaginário, sendo o ato de vestir, para mim, algo extremamente vinculado a memória da ancestralidade que carrego."

SOFIA: "Minha relação com o vestir tem muitas camadas e está em constante transformação. Uma camada importante, para o trabalho com dança, é a questão do conforto e do movimento das roupas. Diria que esta acaba sendo a maior prioridade na escolha de roupas. Mas, existe a camada que diz respeito às transformações que podemos agir em nós mesmas através do vestir: roupas podem desde transformar nosso humor até encarnar e nos possibilitar viver personagens diferentes; isso dentro da cena e também no dia-a-dia. Outra camada, que tem a ver com essas duas anteriores, mas um pouco mais específica e muito especial para mim atualmente, tem a ver com as nossas percepções sensoriais: o tato, o sentir o toque de um tecido em contato com a pele, a textura, o cheiro, o peso, caimento, as cores das roupas: tudo isso são elementos de uma experiência estética que pode nos preencher e satisfazer assim como um bom alimento para o corpo."

MORENA: "Já a minha relação com o vestir parte da minha relação com minha mãe, que era bailarina, figurinista e acreditava na roupa como linguagem capaz de traduzir a nuance camaleoa que ela tinha. Roupas, acessórios, fantasias, maquiagem, figurinos e muitos tecidos faziam parte do mundo da minha mãe, seja em casa ou nos camarins e eu felizmente eu pude acompanhar tudo isso. Como meu corpo cresceu rápido demais, com 11 anos eu já vestia o tamanho da mamãe e iniciei uma série de assaltos ao seu guarda-roupa. Foi a mesma época em que eu comecei a me interessar pela dança. Na minha primeira aula, me vesti inteira com as roupas dela, isso entre os anos 80 e 90. Jamais me esquecerei do cheiro da lycra com o perfume Mauá, que minha mãe usava. Aprendi com ela que a roupa "certa" é a que traduz o desejo, o temperamento e o humor do momento."

 

De que maneira o vestir também permeia suas pesquisas, fazendo conexões com esse corpo e as memórias?

MORENA: "Normalmente as roupas se apresentam antes das danças para mim, porque é como se elas apresentassem uma possibilidade de performar muitas personas. As várias eus possíveis. Quem vai dançar agora? A roupa marca um lugar cheio de indicativos e, a partir delas, posso brincar de sublinhar os signos nelas contidos ou criar fissuras que possibilitem contradições."

INAÊ: "Minha pesquisa ao redor das culturas africanas, e, especialmente da cultura Yorubá, se vincula diretamente com um corpo carregado de memórias que permanecem no tempo, sobrevivendo e resistindo a todo tipo de apagamento e preconceito. As danças que evoco, ligadas as Yabás, orixás femininas do candomblé, são nutridas pelos elementos estéticos que elas carregam; cada elemento guarda em si um significado, um fundamento, conta uma estória, e os vestuários e adereços fazem parte dessa estética profundamente conectada as memórias, que se transformam em dança, música, cantos, etc."

SOFIA: "Estou sempre me perguntando, tanto para o meu dia-a-dia quanto para as criações: como posso me nutrir através da minha relação com o vestir? Como as roupas podem me dar conforto de movimento, alimento para meus sentidos, mas também significados simbólicos, ajudando a tecer narrativas, conectando com personagens, imagens, seres. No projeto MAMA SY YIÁ, a presença da orixá Oxum aparece também através das nossas escolhas nas vestimentas. Ressalto também a questão ética: como meu vestir pode ser mais integrado com o cuidado que nossa casa terra merece? O vestir começou a permear a minha pesquisa de forma mais explícita a partir do projeto Tangos Brasileiros, que criei junto com André Balboni. Esse projeto, que resultou em 5 diferentes peças de dança, que são variações sobre um mesmo tema, tem em seu cerne a questão das energias masculino e feminino e a dança entre elas, de forma nada óbvia, não externa, assim como no tango argentino em que mulher e homem tradicionalmente têm papéis bem definidos e diferentes. O questionamento estava mais na força que essas energias podem ter dentro de uma mesma pessoa: brincamos com os papéis homem e mulher do tango, invertendo, misturando, criando e, principalmente, nos questionando sobre a dança que acontece dentro de cada um de nós entre masculino e feminino. Então, nesse projeto, a vestimenta foi uma parte importante do processo: como podemos transitar entre códigos que representam variações da masculinidade e variações da feminilidade. 
Atualmente, o vestir continua com uma importância na minha pesquisa, só que de uma forma mais abrangente, relacionada aos pontos que trouxe na primeira resposta.”

 

Como foi a construção dessas imagens e vídeos? Quais foram as referências?

SOFIA: "Quando Inaê e eu fizemos os primeiros registros do nosso processo de criação para MAMA SY YIÁ, a referências vieram muito do próprio trabalho com suas nuances: maternidade e suas memórias, emoções em nossos corpos, a relação com a natureza como um colo de mãe, Oxum. A Flávia Aranha viu essas imagens através da fotógrafa que as produziu e nos chamou para uma troca, na qual produziríamos esse material em foto e vídeo com suas roupas. A partir dessa troca, convidamos a Flávia para ser a figurinista da performance de dança com peças da sua última coleção, CAAIPORA. Confiamos então que os fios que estavam guiando a criação de MAMA SY YIÁ eram os mesmos que guiariam essa colaboração: as fotos e vídeos foram produzidas a partir de cenas do espetáculo que estamos criando e que estreará em outubro aqui em São Paulo."

 

FICHA TÉCNICA

 

Direção Sofia Tsirakis

Dança Inaê Moreira, Morena Nascimento, Sofia Tsirakis

Participação especial Sidnei Nogueira

Música e Dramaturgia André Balboni

Direção de arte e cenário Andrea Barbour

Figurino Flavia Aranha

Produção Iolanda Sinatra

Fotográfo e videomaker Marcos Pacheco

Assistente de produção e edição de vídeo Stella Balboni  

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